terça-feira, 13 de maio de 2008

A rifa de Aïnouz


Vi essa semana o último filme de um dos bons diretores do cinema brasileiro atual. “O céu de Suelly” é uma película muito interessante do cineasta Karim Aïnouz, o mesmo diretor de “Madame Satã”. A estória, como o próprio diretor comenta, trata-se de “uma jornada individual e singular em um contexto sufocante, em que a realização do desejo implica em uma recusa dolorosa à submissão dos padrões e exige um esforço constante de reinvenção”. Na verdade o que ele quer dizer com tudo isso é que o filme mostra, assim como em Lilja 4 ever, a força de uma mulher em frente a um ambiente e uma situação hostis e como os seus valores são mutáveis conforme a situação em que elas são inseridas.

O Céu de Suely conta a história de Hermila, uma jovem que retorna com um filho recém nascido de São Paulo para sua cidade natal, no interior do Ceará. Hermila espera, sem sucesso, a chegada do marido e pai de seu filho. Sem novas perspectivas ela tem que reinventar a sua vida, arranjar uma forma de sobreviver e conquistar seu maior sonho que é sair daquele lugar e ir para o mais longe possível. A solução encontrada é uma rifa.

Essa parte do filme me lembrou muito o último dos quatro atos de “Boccaccio 70”, filme inspirado na obra Decameron do poeta italiano Giovanni Boccaccio e dirigido pelos mestres Mario Monicelli, Federico Fellinni, Luchino Visconti e Vittorio De Sica. Nesse quarto ato dirigido por De Sica, intitulado “La Rifa”, Sophia Loren interpreta uma mulher que trabalha em uma espécie de parque de diversões e que para sustentar o irmão e a cunhada promove uma rifa entre os moradores da cidade. O prêmio: uma noite com ela.

Os dois filmes tratam sobre um tema semelhante de formas bem diferentes, enquanto De Sica mostra através da comédia essa mulher que para sua sobrevivência tem que deixar de lado os valores sociais , Aïnouz utiliza-se do drama para mostrar algumas das conseqüências dessas escolhas.

Contudo o que realmente chama atenção no filme de Aïnouz são as interpretações. Em alguns momentos em que a câmera fica afastada e os atores agem com uma naturalidade impressionante, muitas vezes fazendo você esquecer que está vendo um filme. De um realismo perturbador, algumas cenas parecem terem sido retiradas de um momento único e real.

Vale a pena então dar uma conferida nas duas rifas tanto a de Aïnouz quanto a de De Sica, diferentes no estilo, mas iguais em beleza e sensibilidade.



Segue abaixo o trailer de "O céu de Suelly" e um fragmento de "A rifa" :

O céu de Suelly (trailer):




"La Rifa (um pedaço)"





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